30 outubro 2009

um texto e uma música

Na surpresa de uma curva, o deslumbramento. Tão forte que as lágrimas deveriam romper clandestinamente no mais fundo dos olhos. Este lugar é uma enseada, enseada amena, a enseada de Guesclin. Em frente uma pequena ilha, com árvores, uma casa à proa, muralhas, janelas pequenas, e no topo uma grande janela branca e fechada - uma moldura de silêncio. Enquanto houver ilhas, os homens continuarão a ser reis como os reis que o foram. Reis inúteis mas soberanos, imensos, sumptuosos, cobertos pelo manto nocturno das águas. Dinastias arrogantemente supérfluas. Diademas, ceptros, flores venenosas. Se eu tivesse uma ilha, os meus amigos chegavam em barcaças, cantavam baladas de marinheiros, bebiam cidra, deitavam-se com a boca salgada, faziam amor e adormeciam.
Na falta de uma ilha, um livro.
Eduardo Prado Coelho (contracapa de Tudo o que não escrevi volume II)

29 outubro 2009

que cavalos são aqueles que fazem sombra no mar?

e temos de viver por eles também

a alegria de ser entendido sem palavras é o nosso sonho

a nossa sede de afecto é sem limites

talvez a gente ainda vá a tempo de dizer aos nossos mortos que gostamos deles e eles o consigam ouvir porque estão dentro de nós

20 outubro 2009

lentamente os dedos aperfeiçoaram a arte de pararem sussurrantes sobre o corpo *

* Al Berto

depois de te perder/te encontro com certeza/talvez num tempo de delicadeza/onde não diremos nada, nada aconteceu/apenas seguirei como encantado ao lado teu
in muros de Júlio Machado Vaz

14 outubro 2009

esquece. (...) esquece o trabalho que te traz em alvoroço. (...) esquece *

a cadeia do grito



ou a cadeia do ridículo

* Vergílio Ferreira

08 outubro 2009

a coisa mais difícil e mais bonita de partilhar entre duas pessoas é o silêncio *

a maior parte do tempo, porém, o que nós partilhámos era o silêncio. e isso eu aprendi contigo, porque não sabia.
* No teu deserto de Miguel Sousa Tavares

[Here I am and here I'll stay]

05 outubro 2009

chove *

Chove uma grossa chuva inesperada,
Que a tarde não pediu mas agradece.
Chove na rua, já de si molhada
Duma vida que é chuva e não parece.



Chove, grossa e constante,
Uma paz que há-de ser
Uma gota invisível e distante
Na janela, a escorrer...

* Miguel Torga

04 outubro 2009

a terra pertence ao dono, mas a paisagem pertence a quem a sabe olhar *

* no teu deserto de Miguel Sousa Tavares


Alteirinhos - Costa Alentejana

02 outubro 2009

Estou de volta pró meu aconchego *

* Elba Ramalho

[pode uma cidade ser um aconchego?]

...velhas trapaças...