Vou-te amar como nunca te amei. Vamos ter todo o nosso futuro antes de ele nos ter a nós – onde nos vamos amar?
O amor é isso, querida, acumular no começo para se ir depois gastando dele pela vida fora – até quando durou o que acumulámos? Estás inteira jovem perfeita. Agora. Como é bom dizer jovem. Dizer perfeição. Dizer terra, astros e deuses. E estar tudo no teu corpo. Devagar, hesito ainda, devagar. Não quero perder um átomo de ti, do imenso que em ti acumulei, do universo em ti. Mais nua do que a nudez, da tua pele branca. Deve ser o fim do Inverno, depois de despido o queimado da praia. Estás mais desprotegida assim. Como se despisses também a minha imaginação. Como se dissesses assim. Abandonada entregue. Um corpo apenas, material, verificável. Mortal. Mas o que sobrepus nele não se trespassa assim. É preciso atravessar o medo o deslumbramento o impossível. É preciso vencer o mistério – um corpo amado é tão misterioso. Meu corpo de ternura. Havemos de conquistá-lo até um dia. Até quando ele for insuportável de doçura. Devagar. Mas há a tua inquietação. A tua pressa ardência, deixa-me ter tempo de te criar. De te trazer até mim o teu olhar esquivo, os teus desencontros furtivos. A tua agilidade, o oculto de ti. o teu riso, a tua franja irrequieta. A rapidez de seres, a vitalidade desassossegada, a tua alegria agressiva. A tua intensidade de existires – devagar. Atravessar tudo até ao teu mito que está todo no teu corpo nu. Fica longe. Tanto. E então amámo-nos e dizia está bem. Realizar Deus todo inteiro é difícil. Está bem. Tínhamos as galáxias do universo e havia ainda espaço. E isso era de endoidecer. Tínhamos em nós a sua expansão até ao rebentamento de nós. O desmesurado e incrível. Deus olhava o nosso esforço e sorria por cumprirmos o seu poder.
* In em nome da terra de Vergílio Ferreira
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